Tax Compliance and the Money Laundering Crime: legal analysis of ethical and sanctionary measures

Fabrizio Bon Vecchio | Débora Manke Vieira
E-mail: fbvecchio@hotmail.com | deboramanke@gmail.com
Universidade do Vale do Rio do Sinos (UNISINOS) e Fundação Getúlio Vargas | PUC/RS

Resumo
O mundo corporativo e fiscal exige cada vez mais cautela, especialmente após a regulamentação legal dos crimes de Lavagem de Dinheiro no Brasil. A postura ética e as sanções que o ordenamento jurídico pátrio impôs causou uma movimentação ao estímulo de técnicas que atuem como preventivas aos atos ilícitos
fiscais. Com isso, o Compliance Tributário ganhou não apenas a visibilidade internacional, mas interno-econômica, criando um ambiente empenhado no foco de redução dos comportamentos negativos, afastando a falta de ética e ações que poderiam ser consideradas como atos de corrupção. Cabe principalmente às corporações colaborarem com os procedimentos que visem maior transparência da movimentação monetária? Estaria restrito ao aparato estatal a incumbência da prevenção e repressão dos atos corruptos? Como a Lei Anticorrupção está influenciando a cultura empresarial brasileira? Com essas problemáticas o presente estudo irá se ocupar a desvendar empiricamente suas respostas.

Palavras-chave: Compliance Tributário; Lavagem de dinheiro; Lei Anticorrupção.

 

Introdução

Este estudo corresponde à análise da eficácia e aplicação da Lei n° 12.683/2012, que alterou a Lei de Lavagem de Dinheiro, possibilitando que qualquer infração penal apta a gerar bens ilícitos possa ser enquadrada na norma. Os valores éticos dos programas de Compliance ganharam destaque nas grandes empresas nacionais e internacionais, especialmente após todas as regulamentações que aparecem cada vez mais, e que acabam por atuar como mola propulsora apta a gerenciais os fluxos financeiros e tributários, bem como estimular o cumprimento dos padrões éticos, tanto no Brasil, como no exterior. Dessa forma, questiona-se: Caberá apenas às corporações colaborarem com os procedimentos que visem maior transparência da movimentação monetária? Estaria restrito ao aparato estatal a incumbência da prevenção e repressão dos atos corruptos? Como a Lei Anticorrupção está influenciando a cultura empresarial brasileira? Com essas problemáticas o presente estudo irá se ocupar a desvendar empiricamente suas respostas, explorando doutrinas nacionais strictu sensu que tratam do tema, o método utilizado será o hipotético-dedutivo. A análise, em primeiro momento, objetiva compreender o caráter desestimulatório do cometimento do ilícito, isto é, dos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção. Em seguida, as políticas e metodologias modernas das políticas de Compliance Tributário. E, por fim, as diretrizes internacionais acerca do tema.

O crime de lavagem de dinheiro no Brasil

O termo money laundering (em Português, “lavagem de dinheiro”) surgiu nos Es – tados Unidos em 1920. Este foi o período em que os gângsteres estadunidenses ocultavam o dinheiro das atividades ilícitas que cometiam, e como exemplo po – demos citar a venda de bebidas alcoólicas de forma ilegal, e assim os crimino – sos utilizavam as lavanderias para ocultar o valor originário dessa ocupação. Foi na década de 70 (LEVI; REUTER, 2006, p. 290) que o tema passou a ser objeto de maior preocupação, época em que os Estados Unidos uniu maiores esforços na investigação do tráfico de drogas e passou a se empenhar em descobrir de que maneira se lavava o dinheiro proveniente desse crime (CALLEGARI; WEBER, 2014, p. 6), pois antes a lavagem era encarada como um acessório do delito prévio e não como uma importância de crime autônomo. Também por volta de 1970 surgiu a primeira definição legal do crime de lavagem na Itália, especialmente por conta dos crimes cometidos pelas máfias e os proventos obtidos de seus delitos (VERVAELE, 2013, p. 382 – 383). Desse modo, foi também a partir de 1970 que surgiu a “primeira onda” de regulamentação financeira preventiva e administrativa diretamente relacionada às leis bancárias e instituições financeiras adotada pelos Estados Unidos. A lavagem de dinheiro foi estabelecida como um crime autônomo em 1986 nesse país e, em 1988, ocorreu a primeira condenação por lavagem do banco BCCI Bank (Bank of Credit and Commerce International) (VERVAELE, 2013, p. 383).

A Foreign Corrupt Pratice Act (FCPA) é um instrumento jurídico criado nos Estados Unidos, em 1977, sendo a primeira prática com o objetivo de combate à corrupção. Ocasionado pelo famoso caso de pagamento de propinas pela empresa Lockhead Aircraft Corporation aos funcionários públicos de diversos países, durante a Guerra Fria. Conforme os números do Fundo Monetário Internacional (FMI), a circulação de dinheiro, fruto de práticas voltadas a ocultação de ilícitos no mundo, corresponde 30% do total que circula em paraísos fiscais. Em uma perspectiva financeira, projeta-se a estimava de que esse montante gira em torno de US$ 590 bilhões e U$ 1,5 trilhão (LIMA; GULARTE, 2017, p. 123). Essa auto regulação decorre da exigência natural do mercado para cumprimento de normas comportamentais que se concretizam em instrumentos, como os códigos de conduta e governança corporativa. No Brasil, a Lei 12.683/2012 alterou o artigo 1º da Lei 9.613/1998, denominada Lei de Lavagem de Dinheiro, para extinguir os crimes antecedentes ao desvio de ativos e tornando eficiente a persecução criminal. A alteração passou a incluir qualquer infração penal como passível de consideração ao crime antecedente de lavagem de ativos, desde que seja capaz de gerar bens ilícitos – é o caso de países como Bélgica, México, Suíça e Estados Unidos. Anteriormente, a lavagem de dinheiro era classificada como um crime derivado e acessório, considerando que se trata de delito que pressupõe a existência de uma infração penal anterior, isto é, um crime antecedente. Com a alteração, a lavagem de dinheiro depende de uma infração penal antecedente, que pode ser um crime ou uma contravenção penal. Ainda será necessário observar o binômio infração antecedente/ lavagem de ativos. Portanto, os delitos anteriores deixam de ser numerus clausus passando a incluir qualquer infração penal, desde que caracterize um alto potencial de gerar ativos ilícitos, colocando um fim de consideração as infrações penais antecedentes à lavagem de dinheiro os delitos fiscais (tax crimes) sob influência das 40 Recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), incluindo os impostos diretos e indiretos (ARAS, 2012, p.5). O ordenamento jurídico de alguns países é preexistente a esta recomendação do GAFI. Portugal, Alemanha, França, Itália e Espanha consideravam os delitos fiscais como crimes aptos a gerar ativos de origem delituosa, antes do Brasil. Caso emblemático ocorreu na França, onde os contribuintes obtiam rendimentos ocultos e os investiam em apostas de cassinos, transformandoos em ativos lícitos, porém, não tributáveis. Em complementação, a lei italiana compreende que devem ser considerados os elementos advindos de atividades fraudulentas que impedem o empobrecimento do patrimônio, isto é, evitando a tributação para decréscimo do mesmo. No Brasil, o que é passível de punição é a fraude que acarretou na supressão ou redução do tributo, a possibilidade de diminuição das receitas federais ou, ainda, a prestação tributária não entregue – que assim constitui uma vantagem econômica ilícita devendo ser considerada como fonte material de lavagem de ativos. A adoção de medidas de controle reclama a participação de autoridades incumbidas da prevenção e repressão, por exemplo, instituições financeiras, bolsas de valores, administradoras de créditos e todas aquelas disciplinadas no artigo 9º da Lei 9.613/98. Inclusive a atuação do COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), no Brasil, desenvolve importante papel ao aplicar penas administrativas e receber ocorrências suspeitas de lavagem de dinheiro. O COAF publicou a Resolução nº 31, de 07 de junho de 2019, que disciplina os procedimentos a serem adotados para a aplicação imediata de sanções, tais quais, a indisponibilidade de ativos – proibição de transferir, converter, transladar, disponibilizar ativos, ou deles dispor, direta ou indiretamente, segundo o inciso II, do artigo 2º, da Lei 13.810/2019, estabelecendo que os sujeitos obrigados à regulação e fiscalização do conselho, devem implantar procedimentos e controles internos para identificação de pessoas sujeitas às sanções, bem como treinar seus empregados para as medidas instituídas pela norma. Desta forma, fortalecendo e consolidando a atuação do Compliance Tributário. Pouco importa se o agente quis efetivamente ocultar patrimônio ilícito (dolo direto) ou assumiu o risco de contribuir para esse resultado ao inobservar de pronto algum dos deveres expressos de colaboração (dolo eventual). Há que se atentar que a macro criminalidade moderna atinge interesses não diretamente individuais, mas sim de toda a coletividade e, caso a inobservância de algum dos deveres inerentes ao Compliance venha a viabilizar ou, de qualquer forma, facilitar a ocultação do patrimônio de origem ilícita, deve o agente ser penalmente responsabilizado, embora não exija o conhecimento exato sobre a atividade delituosa que proporcionou o ganho patrimonial (MAGALHÃES, 2014, p. 170).

Os ilícitos descritos na Lei 12.846/2013 não guardam subsunção com os crimes de corrupção restritamente, possuindo maior abrangência. O objeto da lei, é fazer com que o ambiente negocial brasileiro evolua até a chegada do momento em que as próprias companhias passarão a investir estrategicamente no aprimoramento de seus sistemas de integridade diante da percepção dos benefícios que são gerados pelo cumprimento de regras e regulamentos (ZENKNER, 2019, p. 44). O Corruption Perception Index (Índice de Percepção da Corrupção), o principal indicador de corrupção no setor público, divulgou em Janeiro de 2019, 13 avaliações de especialistas internacionais sobre diversos comportamentos corruptos, incluindo: (a) suborno; (b) desvios de fundos públicos; (c) uso de cargo público para ganhos privados; (d) nepotismo e (e) a “captura do estado”, uma forma se corrupção política que ocorre quando um determinado ente estatal é criado para agir de acordo com o interesse público, mas age em benefício de interesses econômicos e/ou políticos de grupos específicos. O Brasil atingiu o 105° lugar, o pior índice desde 2012, após o início da Operação Lava Jato. Esta que veio à tona uma espécie de macrocorrupção, organizada de forma institucionalizada, com o objetivo de defesa de grupos políticos e grupos empresariais, ocultando ativos de forma massiva perante o fisco. Trata-se, de fato, de um problema gravíssimo, uma vez que a corrupção, tal como a assistimos atualmente, está enfronhada em todas as esferas e níveis da Administração Pública e em todos os setores da economia nacional, com grave violação ao Direito, as leis e aos Princípios da Ética e da Moralidade, colocando em risco a própria Democracia, o Estado de Direito e os pilares da República (RODRIGUES, 2018, p. 4). Até outubro de 2018, segundo o Ministério Público Federal, foram 215 condenações de 140 pessoas, resultados em 176 acordos de colaboração premiada e 11 acordos de leniência, com a estimativa de R$ 6,4 bilhões de propina que foram devolvidos aos cofres públicos. Conjuntamente com a atuação do COAF e autoridades policiais, de janeiro a novembro de 2018, possibilitou o bloqueio judicial de R$ 125 milhões no Brasil e exterior, relacionados a investigações sobre lavagem de dinheiro e crimes relacionados. Evoluções quanto a disseminação de integridade no ambiente público e privado, o ambiente de tornar obrigatórios os programas de Compliance para empresas que celebram contratos públicos milionários, demonstram a evolução e efetividade da Lei Anticorrupção. A estimativa de gastos com um grupo de profissionais atuantes pode onerar o orçamento empresarial, mas, em contrapartida, a multa para os casos de corrupção pode chegar a 20% do faturamento bruto anual, podendo levar à falência. Quando não se pode estimar esse percentual, as multas variam de R$ 6 mil à R$ 60 milhões de reais, dependendo do capital investido. Não há como negar a necessidade de a empresa preparar-se financeiramente para a implantação de um programa de Compliance. Deverá contratar especialistas no assunto, investir em treinamento permanente para os seus empregados em todas as unidades, elaborar um Código de Ética que estabeleça procedimentos e as devidas punições, melhorar os mecanismos de controle internos e externos para aprimorar o gerenciamento dos riscos, investir em tecnologia da informação, entre diversos outros investimentos, que podem variar, dependendo do formato e do objetivo de cada empresa (RIBEIRO; DINIZ, 2015, p. 93). As sanções brasileiras são consideradas as mais severas entre os 35 países que editaram legislações análogas de responsabilidade de pessoas jurídicas por atos de corrupção transnacional. Variando de publicidade da decisão condenatória, inscrições em cadastros de empresas corruptas e impossibilidade de contratar com as esferas administrativas, condenação a perdimento de bens, reparação de danos ao erário, suspensão de benefícios e incentivos público levando até a suspensão das atividades. As condutas criminosas que o legislador tenciona perseguir são condutas que buscam ocultar e dissimular a origem dos bens, dificultando o rastro do dinheiro ilícito até a sua origem, que em sua maioria está ligada às organizações criminosas. Por exemplo, nesse âmbito, sobre o conteúdo da lei de lavagem de dinheiro brasileira (Lei 9.613/98), a mera “utilização”, sem a ocultação ou dissimulação da origem do bem, que esteja inserido no sistema legal como se fosse lícito, não constitui crime. Caso contrário, seria ilógico, pois, qualquer delinquente que fizesse uso do provento econômico obtido por meio de crime anterior seria caracterizado por lavagem. E não é só, seria inútil criminalizar as condutas de ocultar e dissimular o objeto lavagem ou ocultar e dissimular a utilização deste objeto, se o mero uso também equivaleria ao crime de lavagem (VILARDI, 2014, p. 20). Além da preocupação com a criação da percepção de risco sobre os contribuintes faltosos, deveria ser função da administração tributária operar em prol do desenvolvimento de ações que, mediante recompensas positivas, estimulem o maior cumprimento pela sociedade da legislação tributária, uma vez que é voltada para a obtenção de arrecadação aos cofres, isto é, pouco importando distinguir uma ação – se sancionatória ou de recompensas -, desde que a consecução dos objetivos tenha a mesma dupla finalidade: punitiva e pedagógica (desestimular a repetição do ilícito). Em um Estado Democrático, a aplicação de uma sanção tributária exige a ocorrência de um ilícito, seu perfeito enquadramento na hipótese de uma norma sancionatória e a reprovabilidade da conduta do infrator ou sua culpabilidade. Considerando que uma resposta meramente repressiva ao crime de lavagem de dinheiro se mostra insuficiente, sob a ótica do número de condenações penais, colaboração das instituições para que lancem programas de controle interno para cumprimento efetivo das obrigações – principais e acessórias – tributárias. Há uma importante classificação que distingue a existência de três tipos penais de lavagem de dinheiro: (a) o tipo penal de intenção, onde a conversão ou transferência dos objetos patrimoniais produzidos ilegalmente com uma determinada finalidade; (b) o tipo penal de ocultação, onde a ocultação ou encobrimento da natureza, da origem, da disposição e dos direitos sobre isso; e (c) o tipo penal de aquisição ou posse, a aquisição, posse ou o uso de tais objetos patrimoniais condicionados aos princípios constitucionais e às características da ordem jurídica (AMBOS, 2007, p. 17). Por outro lado, em face da distinção dos ordenamentos jurídico aos nacionais e o direito alienígena não é congruente criar normas penais self-executing (autoaplicáveis), pois o princípio da legalidade, impõe ao operador jurídico a utilização das normas penais internacionais na medida em que estiverem positivadas em seu código nacional. (LIMA; GULARTE, 2017, p. 122). O cumprimento ou descumprimento de uma norma são, algumas vezes, uma questão de oportunidade, além de relacionar-se com a vontade do contribuinte de pagar o tributo ou evadir a norma. Os contribuintes percebem a relação com o Estado não apenas como uma relação de coerção, mas também como de troca; infelizmente existem casos em que o contribuinte percebe que seus tributos não são aplicados da forma com deveriam, e isto serve também como mais uma justificativa para tais atos. Há um longo caminho antes do sujeito tornar-se um sonegador, em três passos: o contribuinte deve ter o desejo de não observar as normas; nem todos com a inclinação para sonegar são capazes de transformar a intenção em ação; e indivíduos inclinados a sonegar tributos observam a oportunidade de fazer isso (MARTINEZ, 2014, p. 327). Valor é aquilo em função do qual alguém age para obter e/ou preservar. O valor é algo que denota uma preferência de um sujeito na relação que ele estabelece com algum objeto, no contexto da ação humana. Por exemplo, pode um sujeito poder escolher arriscar a vida para salvar um amigo, se considerar que a vida deste tem, um valor superior à sua própria. Da mesma forma, pode escolher se omitir de fazê-lo, se considerar a sua própria integridade mais valiosa. Antes de agir, precisa optar e os delitos fiscais é possível visualizar o mesmo raciocínio (CARVALHO, 2005, p. 34).O cenário brasileiro está otimista com as novas regulamentações legais que o plano internacional influenciou no momento em que estamos vivenciando. Apesar de parte de setores produtivos verem com maus olhos esse sistema de “extermínio” das práticas delituosas fiscais, e os emblemáticos esquemas políticos de lavagem de dinheiro e corrupção, finalmente estamos alcançando um patamar ideal para as negociações tributárias, inclusive pelo estado de crença na tributação ótima, isto é, de equilíbrio e eficiência. Isto acabara por fim levando à implementação de mecanismos de negociações mais amplas e também de conciliações tributarias.

O Compliance tributário como forma de mitigação dos crimes Jornal jurídico de lavagem de dinheiro

Em 2011, a lei inglesa UK BRIBERY ACT passou a responsabilizar as empresas pelas falhas de prevenção aos atos de corrupção, sendo passível de isenção, apenas em casos que houve efetiva demonstração de que utilizou os procedimentos adequados antecedentes ao cometimento do ilícito. Essa regulamentação ampliou a atuação do Compliance no meio corporativo, retirando o caráter restrito das grandes corporações e passando a se popularizar entre os setores financeiros e econômicos, inclusive no setor público. O movimento de endurecimento do combate à corrupção em nível internacional tem se refletido na criação de novas legislações em diversos país, com destaque para o Reino Unido, com a sua Lei Anticorrupção de 2010 (“UK Bribery Act”), considerada uma das legislações mais fortes do mundo e aplicável não somente ao suborno de funcionários públicos mas também no setor privado. Na América Latina, destaca-se a aprovação recente da lei anticorrupção do México, com sanções significativas e alinhas as principais convenções internacionais. (MAEDA, 2013, p. 169) A percepção que o direito sancionador trouxe a essas medidas revelou uma instrumentação apta à prevenção de lavagem de dinheiro, especialmente quanto aos deveres de controle das operações e monitoramento sistêmico do fluxo de caixa trazidos pela Lei Anticorrupção (Lei 13.306/2016. Os programas de Compliance anticorrupção têm o poder de, além de estimular um ambiente de negócios pautado por princípios éticos, melhorar a governança corporativa das empresas, tornando-as mais atrativas aos investimentos. A cultura de Compliance fortalece o sistema de gestão de pessoas, melhorando o clima dentro das organizações, e tem o condão de minimizar multas por violação das normas, além de proteger a imagem e reputação das empresas (CANDELORO, 2014, p. 58). O Compliance esclarece e dá segurança para quem utiliza de ativos financeiros para prevenir operações legais que podem acarretar em desfalques à instituição e seus investidores (BENEDETTI, 2014, p. 75). O Fisco está atento aos processos operacionais dos contribuintes, e utiliza as informações que estão em sua pose para realizar o controle fiscal e verificar se estão agindo de acordo com as normas tributárias atentando-se as disposições legais da Lei 12.846/13 (Lei Anticorrupção). O remédio para evitar complicações fiscais no âmbito tributário é a adoção de sistema de gestão de Compliance . Os objetivos são inúmeros, dentre os quais estão: (a) cumprir com a legislação nacional e internacional, além das regulações do mercado e das normas internas da empresa; (b) prevenir demandas judiciais; (c) obter transparência na condução dos negócios; (d) salvaguardar a confidencialidade da informação outorgada à instituição por seus clientes; (e) evitar o conflito de interesses entre os diversos atores da instituição; (f) evitar ganhos pessoais indevidos por meio da criação de condições artificiais de mercado, ou da manipulação e uso da informação privilegiada; (g) evitar o ilícito da lavagem de dinheiro; e (h) disseminar na cultura organizacional, por meio de treinamento e educação os valores de compliance (CANDELORO; RIZZO, 2012, p. 37-38). É necessário elaborar normas de comportamento que apoiam as medidas anticorruptivas, bem como instituir sistemas que incentivem estes comportamentos, o que requer tempo para alcance de eficiência (RIBEIRO; DINIZ, 2015, p. 98). Por analogia, é aplicada às empresas a teoria de Douglas North que dispõe do desempenho econômico através do tempo, isto é, não é a imposição de regras formais ou informais que alterará os modelos tradicionais. Uma vez que afetam a confiança pública de modo a surrupiar a integridade das instituições, os atos antiéticos e de corrupção interna. A comunicação massiva dificulta a análise de procedimentos para investigação de cometidos ilícitos. E, em que pese seja uma obrigação estatal o asseguramento da defesa social, é razoável impor uma função colaborativa com cunho fiscalizatório para prevenção de atividades fiscais- incriminatórias. A atuação do Compliance é proporcionar a utilização de mecanismos éticos, capazes de proporcionar ou majorar lucros, sem que a atividade empresária infrinja os limites constitucionais do poder de tributar, ocasionando sonegações ou colocando início à ocultação/ lavagem de ativos. A geração de uma cultura ética, mas voltada para resultados, requerer quatro atributos segundo as diretrizes do Compliance: (a) foco no aumento de produtividade; (b) crescimento, eficiência; e (c) redução do comportamento impresumível e negativo. Sem eles, a empresa não resiste às pressões de mercado, como concorrência, cobrança de clientes e exigências administrativo-mercadológicas. Mas é preciso salientar que a criação de uma cultura ética não deve suprimir a finalidade do lucro empresarial (ANTONIK, 2016). Para obter uma eficiência em um programa de Compliance é apropriado que toda a organização seja engajada, de forma a se envolver com as normatizações pertinentes. Criando um ambiente de empenho em alcançar as melhores práticas, buscando estar alinhado com as legislações, regras internas das instituições, mantendo assim um afinco nas condutas de trabalho (CICCO, 2008, p. 123). Alguns riscos recorrentes e comuns em que a falta de um modelo de conduta ética praticada pela administração, aliado às inconsistências nas ações; sobretudo, não possuindo políticas e procedimentos anticorrupção implementados e, quando existentes, a forma de comunicação não é eficaz e os treinamentos são inadequados. O receio de encontrar surpresas é o maior obstáculo para realizar avaliações de risco (CLAYTON, 2013, p. 152). A sociedade do século XXI impõe a existência de empresas confiáveis: fidelização do cliente, serviços de qualidade, investidores de modo que é necessária a implantação de códigos de ética, de conduta, padrões de integridade (ANTONIK, 2016, p. 46). Além disso, em caso de fraudes fiscais, a empresa deve reportar o ocorrido às autoridades competentes e colaborar com agentes externos para elucidas a situação fática. A adoção de programas de Compliance efetivos permite que se reduzam os riscos das condutas ilícitas. Caso alguma violação venha a ser cometida não obstante os esforços de prevenção adotados, programas de Compliance efetivos aumentarão as chance de que a própria empresa a detecte, podendo agir rapidamente para investiga-la e remediá-la e, se for o caso, decidir pela colaboração como forme de reduzir eventuais sanções. O fato de a empresa poder demonstrar que agiu de modo diligente e de boafé ao adotar e implementar mecanismos razoavelmente bem estruturados para evitar violações pode ser fator mitigador de sua responsabilidade. Ser ético pressupõe a ação de respeito aos padrões éticos, portanto, o Compliance é a observância ética e legal, o fomento contra as práticas de lavagem de dinheiro e incentivo da cultura fiel aos limites tributários.

A cooperação jurídico internacional relativa ao crime de lavagem de dinheiro

A cooperação internacional em matéria penal passou a ser mecanismo eficaz no enfrentamento da nova criminalidade, que fixa suas atividades de acordo com a permissividade que os sistemas jurídicos lhe oferecem. Mais que um compromisso moral pode ser traduzida como uma obrigação jurídica, decorrente da intensificação do fluxo financeiro tecnológico. Ora, na atualidade, qualquer pessoa pode estar presente em qualquer lugar do mundo, utilizando-se da tecnologia o que facilita o crime organizado (ANSELMO, 2013, e-book). Essa nova criminalidade de poder é altamente especializada – notadamente econômico-financeira -, sendo de maior lesividade do que a criminalidade de massa o que dificulta a responsabilização penal, provocando a banalização do Direito Penal como vetor contra esse crime (VALENTE, 2010, p. 50). Os primeiros esforços concretos contra o narcotráfico e a lavagem de dinheiro foram realizados pelas Nações Unidas através da “Convenção de Viena” (Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas), ocorrida em 1988, na Áustria. Surgiu, então, o primeiro instrumento jurídico internacional que tornou típico o crime de lavagem de dinheiro. As organizações criminosas atingiram um patamar globalizado em forma empresarial, havendo a necessidade de unir empenhos internacionais dos Estados. Dentre várias medidas que os Estados-membros devem adotar após a ratificação da Convenção, uma delas seria o comprometimento de tipificar algumas condutas em seus ordenamentos pátrios no intuito de combater o crime organizado transnacional, sendo a lavagem de dinheiro um dos crimes incluídos, ao lado de, por exemplo, a corrupção e obstrução da justiça (MEDRONI, 2006, p. 15).

Por outro lado, o Estado encontra no combate à lavagem de dinheiro uma forma de neutralização deste poder, buscando o bloqueio dos valores oriundos da atividade ilícita, descapitalizando as organizações e sobretudo, reduzindo o poder. Sobretudo, como a crescente expansão dos negócios além das fronteiras:

“ […] o notório desenvolvimento das operações cambiais e financeiras, com claros sinais de também crescentes e profundas distorções criminosas, mas particularmente a evidente superação das barreiras econômicas, políticas e jurídicas num mundo cada vez mais globalizado, levam qualquer observador preocupado a se convencer de que é preciso repensar as instituições respectivas e o funcionamento das suas burocracias administrativas e política tradicionais, já incapazes de dar conta das novas exigências dessa realidade aparentemente sem limites.” (CASTILHO, 2002)

As consequências trazidas pelo descumprimento de legislações anticorrupção têm sido cada vez mais significativas; além de multas milionárias, notícias envolvendo práticas de corrupção causam sérios danos à reputação das empresas. Afinal, uma simples comunicação de que uma empresa está em um processo de investigação ou colaborando com as autoridades na apuração de possíveis violações gera efeitos imediatos no valor das ações empresariais. A repercussão praticamente imediata nos valores das ações da empresa foi observada no caso envolvendo o Wal-Mart, em abril de 2012, nos Estados Unidos. Isso, após a divulgação de possíveis violações de legislações anticorrupção por condutas ocorridas no México, as ações sofreram queda de aproximadamente 5% no país (MAEDA, 2013, p. 169). No âmbito internacional, a atuação das autoridades responsáveis tem sido cada vez mais aprimorada e intensificada. Os incentivos financeiros ofertados a denunciantes que comuniquem violações podem chegar a 30% das penalidades impostas. A finalidade do benefício da redução das penalidades seria a concessão de incentivos para as empresas se auto protegerem e realizarem atividade que é propriamente estatal no combate à corrupção. Em 2009, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) publicou a Recommendation for Further Combating Bribery of Foreign Public Officials (em Português, “Recomendação para Combate ao Suborno de Funcionários Públicos Estrangeiros), na qual foi elaborado o documento Good Practices on Internal Controls, Ethics and Compliance (Boas Práticas em Controles Internos, Ética e Compliance), tendo como boas práticas: (a) comprometimento/ engajamento da alta administração; (b) avaliação dos riscos; (c) política corporativa (criação de um código de ética); (d) comunicação e treinamento contínuo; (e) canal de denúncia e controles internos; (f) auditoria em terceiros (due diligence) e (g) revisão periódica.As recomendações servem como um norte para os países membros a fim de padronizar as regulamentações, medidas legais e operacionais no combate à lavagem, ao financiamento ao terrorismo, proliferação de armas de destruição em massas, além dos demais crimes que afetem o sistema econômico internacional. De início, a organização tinha a preocupação apenas de combater o crime de lavagem, entretanto, em 2001, foram adicionados novos padrões, sendo dessa vez em combate ao crime de financiamento ao terrorismo criando oito recomendações especiais. Em 2004, foram criadas mais nove recomendações na luta contra ambos os crimes e, recentemente, em 2012 foi realizada uma revisão das recomendações, tendo sido adicionadas questões como o financiamento da proliferação de armas de destruição em massa. Cada vez mais dispende-se uma preocupação maior sobre a lavagem de dinheiro, uma vez que ela se desenvolve na velocidade que também evolui a tecnologia e os meios de informação. E desse modo, no mundo globalizado que vivemos hodiernamente, mostra-se imprescindível a cooperação de âmbito internacional no que se refere à troca de informação de diversas autoridades em diferentes áreas, além de facilitar a cooperação penal e processual penal (TROVATO, 2009, p. 69). O crime de lavagem de dinheiro foi inicialmente criado para combater o narcotráfico e o terrorismo, entretanto hoje não está mais vinculado somente a esses crimes, mas também a outros delitos graves, ao passo que em alguns países vincula-se à toda classe de delitos (BAJO, 2009, p. 11). Importante esclarecer que os programas de Compliance têm função importante na governança corporativa. Contudo, a melhor maneira de julgar o comportamento e a cultura da empresa é por meio de análise específica das medidas, das políticas, das ações, e não por meio de um checklist dos programas de Compliance. A lei não deveria questionar se a corporação adotou um rígido framework prescrito e, sim, questionar se as ações da empresa são razoáveis para impedir a corrupção (XAVIER, 2015, p. 73). Os programas de Compliance não devem ser desencorajados, mas nunca devem ser prescritos de uma forma que comprometam a sua eficácia. A melhor maneira de determinar se uma empresa é culpada, seja sob o regime de responsabilidade indireta atual ou pela abordagem do ethos corporativo, é examinar suas políticas e práticas individuais. A lei não deve perguntar se a empresa adoptou um quadro relativamente rígido prescrito pela Comissão de Sentenciamento. Deve-se perguntar se as ações da corporação foram, em geral, de acordo com os esforços razoáveis para assegurar o cumprimento da lei (STUCKE, 2014). A gestão empresarial pode contribuir, desde que demonstrado a boa-fé em suas atividades; uma figura fundamental pode ser a dos stakeholders – grupos ou indivíduos com interesses diretos ou indiretos que tem ou reivindicam, propriedade, direitos ou interesses nas empresas e nas suas atividades. São dois os critérios orientadores desse trabalho: o nível de dependência desses grupos ou indivíduos e a relação desses com as sociedades empresariais. Essa tarefa permite estabelecer estratégias em relação à aplicabilidade dos recursos empresariais (BARBIERI; CAJAZEIRA, 2009, p. 25). Os estudiosos, cada vez mais, começaram a desenvolver e disseminar a ética empresarial, no campo de estudo. Com isso, o ensino da Ética nas faculdades de Administração e Negócios, em meados das décadas de 60 e 70, principalmente nos Estados Unidos, contaram com a contribuição de alguns filósofos, vez que completavam a formação empresarial, aplicando os conceitos de ética à reali – dade dos negócios, criando assim, uma nova dimensão denominada ética em – presarial (ARRUDA; WHITAKER; RAMOS, 2003, p. 53). Nesse diapasão, a ética empresarial surge como um termo que pressupõe princípios e padrões que orientam o comportamento no mundo dos negócios e a cultura organizacional, ou seja, se um determinado comportamento específico exigido é certo ou errado, ético ou antiético, é assunto que será frequentemente debatido pelos stakeholders, tais como investidores, clientes, grupos de interesse e empregados. Enfim, por toda cadeia envolvida e pelo sistema jurídico aplicável, mesmo que esses grupos não estejam necessariamente certos, suas opiniões influenciam a aceitação ou rejeição, pela sociedade, de empresa e de suas atividades (FERRELL; FRAEDRICH; FERRELL, 2001, p. 7). Essa ideia, nos leva a compreender que a responsabilidade social empresarial está se tornando hegemônica na visão de que os negócios devem ser conduzidos de forma ética, obedecendo a rigorosos valores morais, de acordo com comportamentos cada vez mais universalmente aceitos como apropriados. Todas as atitudes e atividades da organização necessitam desse ponto de vista e caracterizar-se por: (a) preocupação com atitudes éticas e moralmente corretas que afetam todos os públicos e stakeholders envolvidos; (b) promoção de valores e comportamentos morais e legítimos que respeitem os padrões universais de direitos humanos e da cidadania e participação na sociedade; (c) respeito ao meio ambiente e contribuição para sua sustentabilidade em todo o mundo; (d) envolvimento nas comunidades em que está inserida a organização de modo a contribuir no desenvolvimento econômico e humano dos indivíduos ou até mesmo atuando diretamente na área social, em parceria com governos ou isoladamente (ASHLEY, 2002, p. 7). Resta clara a necessidade da criação de mecanismos de cooperação que não sejam meros bancos de dados que trocam informações ou cumprem diligencias, e sim verdadeiros aparatos de inteligência com capacidade administrativa, investigativa e executiva para efetivamente fazer frente aos crimes de lavagem e ocultação de capitais com características transnacionais.

Considerações finais

A Lei Anticorrupção certamente alterou o comportamento da coletividade. Não pela redação bem articulada com o objetivo de punir severamente os delitos elisivos ao sistema fiscal, mas com o incentivo aos programas de controle e fiscalização, o Compliance tributário, trouxe um novo semblante aos métodos integrativos e contínuos para redução dos riscos de corrupção. Tornou-se tema obrigatório em qualquer pauta empresarial que pretenda negociar e transacionar com governos, empresas e pessoas, sejam elas nacionais ou estrangeiras. O índice de Percepção da Corrupção apesar de indicar o Brasil como um país suscetível aos crimes de ocultação de ilícitos caminha de forma equiparada aos mais eficientes instrumentos jurídicos preventivos, deixando explícito que os delitos fiscais precisam ser públicos e tratados com cautela por todos aqueles que acreditam nos valores éticos no âmbito corporativo. Com o advento das novas regulações anteriormente tratadas, o Brasil mostra, de forma clara e inequívoca, que a prevenção à corrupção e aos atos de não conformidade tem agenda permanente no território nacional. Não cabe apenas às empresas e corporações colaborarem com os procedimentos, mas o comportamento ético dos internos, sócios gerentes e todos os envolvidos na movimentação monetária devem contribuir ativamente com a transparência nas relações. Há muito tempo abandonou-se a ideia de que somente o aparato estatal está incumbido de prever e repreender os atos de corrupção. As medidas de Compliance buscam justamente essa prevenção antes da notitia criminis de um ato ilícito praticado e, conjuntamente com as medidas internacionais destinadas às boas práticas empresariais, tem reduzido significativamente – ainda que de forma tímida – os números de corrupção.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *